Vamos começar por aqui: ninguém é a favor do aborto. A discussão deve ser se somos ou não a favor do aborto clandestino e que mata cerca de 2.000 mulheres todos os anos.
O real objetivo dessa luta é defender a vida das mulheres que recorrem ao procedimento em condições precárias. E verdade seja dita, as mortas por aborto são exatamente as mulheres pobres e periféricas, pois as ricas pagam por ótimas clínicas e tem o procedimento seguro garantido.
No Brasil, nos dias 3 e 6 de agosto desse ano, o Instituto Anis e o PSOL conquistaram duas audiências públicas sobre o tema, decorrentes da ADPF 442 protocolada junto ao Supremo Tribunal Federal, e que argumenta pela descriminalização do aborto no Brasil.
Isso significa que, caso o STF acate a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental, não será mais considerado crime interromper voluntariamente uma gravidez no nosso país. Seria uma conquista tímida, mas de grande importância para a história da luta das mulheres brasileiras.
Mais do que isso, a ADPF nos deu uma oportunidade de ouro: conversar sobre o aborto. É importante que esse assunto saia da sombra dos tabus. Precisamos, de uma vez por todas, colocar o debate na caixinha certa: não podemos colocar na cadeia as mulheres que abortam. É urgente que encaremos a situação como caso de saúde pública.
Em 2015, 123.312 mulheres foram internadas por complicações no procedimento. Em 2010 a curetagem foi a cirurgia mais realizada pelo SUS, o que custou mais de 16 milhões de reais ao orçamento de saúde neste ano. Cada procedimento custa 130,77 reais de acordo com a tabela do SUS. Em 2015 foram 181 mil mulheres. E esse número só tende a crescer.
A Pesquisa Nacional do Aborto aponta que uma a cada cinco brasileiras de até 40 anos de idade já realizou pelo menos um aborto. O perfil majoritário da mulher que aborta – segundo a pesquisa – é que ela é religiosa, casada, possui ao menos um filho. Muito nos enganos quando pensamos que recorrer ao procedimento é um recurso só das jovens e adolescentes.
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O aborto é uma realidade na vida das mulheres, e é tempo de mudarmos o foco sobre o assunto. O Estado tem responsabilidade de garantir uma educação sexual formativa nas escolas para que a contracepção e os riscos de uma vida sexual desprotegida podem causar. É preciso também a garantia ao acesso de anti-concepcionais para todas aquelas que assim desejarem se proteger, e isso não significa somente os métodos hormonais. E por fim, é preciso garantir o direito legal ao aborto, seguro e gratuito.
Somente assim, mudaremos a realidade desses números tristes e caminharemos para o futuro, tal qual em países como o Uruguai, que desde a legalização tem experimentado uma queda crescente de abortos realizados e nenhuma morte desde 2012.
É pela vida das mulheres!